OS OSSOS DA NOIVA
Imagem tirada do Google imagens
Os ossos da
noiva
Charles
Kiefer
De fato não sou um crítico literário e não me interesso
em devassar uma obra do ponto de vista da crítica, porque ou o livro me agrada
ou não me agrada e é só isso, e se não me agrada, simplesmente ignoro, não
comento.
O livro é escrito de forma bastante curiosa. O narrador
está a dialogar com sua tia, uma mulher já em idade avançada, mas ele o faz de
maneira muito interessante. Não estamos diante de um livro com tempo linear,
pois vai e vem em momentos que interessam ao narrador sem perder com isso o fio
da meada. É difícil construir um raciocínio coerente sem se perder na narrativa,
quando os fatos não se desencadeiam na mesma linha de tempo em que se deram, o
que dá um charme especial à leitura.
A
conversa envolve um tema difícil de falar no Brasil, porque temos aquela ideia
de que um país miscigenado como o nosso não sofre de jeito nenhum com o racismo
de cor.
O
Brasil é um país continental de território vertical, muito diferente dos EUA
que é também um país de dimensões continentais, mas de território horizontal.
Por aqui, o território se divide em norte e sul e quanto
mais ao sul mais comum o preconceito racial ligado à cor da pele. O escritor é
gaúcho de Porto Alegre e tem a coragem de tratar do tema num romance de pouco
mais de 120 páginas.
A abordagem que o escritor Charles Kiefer imprime à sua
obra é de alguém que ouviu falar do amor à primeira vista entre sua tia Circe e
José Cármio, um caixeiro viajante, negro, que foi aportar-se na cidade de Pau-d’arco
nos idos de 1958, quando foi designado como vendedor pela empresa em que
trabalha para cobrir a região, que inclui essa cidade.
Acontece que o lugar é uma colônia alemã, fruto da
emigração ocorrida no término do século XIX e início do século XX em que
italianos e alemães dentre outros povos da Europa central e leste se radicaram
no sul do país por causa do clima, propício a cultura da uva, bem como, de
outras culturas de clima frio.
José Cármio se dirige à cidade para sua primeira venda e
vai direto à loja Ferragens Brechen, de Gustavo Brechen, um descendente de
alemães, calvinista, rigoroso e preconceituoso.
O
vendedor não deu sorte foi informado de que ele não está
Na
casa do Sr. Gustavo as mulheres da família estão reunidas às voltas com a
feitura de doações para os festejos e que nesse ano em especial pretendem ir à
forra, porque farão os maiores números de bordados e guardanapos a serem sorteados
nas barracas das quermesses e com isso recuperar o posto da família Brechen de
campeã de doações, perdido no ano anterior.
Mas
as mulheres quando estão reunidas só falam dos casamentos e do baile dos
noivos, tradição em Pau d’Arco, que acontece anualmente, e dona Inês esposa de
Gustavo Brechen não perde a oportunidade para cutucar sua filha Circe, que
apesar de cheia de pretendentes e ser considerada a mais bela jovem da cidade,
ainda não tem sequer um namorado e a mãe preocupada com a demora, logo vai
dizendo que suas amigas já se casaram. A conversa rende e depois de muita
verborragia, enfurecida, a filha sai
pisando duro e sobe as escadarias para seu quarto.
O
sol está castigando, é verão. José Cármio para debaixo da janela e pergunta:
“Senhorita, onde posso encontrar Gustavo Brechen?” havendo respondido e só
depois de recolocar os óculos é “que pôde fitar teu rosto com mais vagar”.
Há
quem não acredite em amor à primeira vista, mas há casos em que só assim o
improvável se faz realidade. Liricamente ele descreve o momento dizendo: “Não seria exagero afirmar que José Cármio
sentiu, diante do teu esplendor, uma dor aguda no estômago, uma fraqueza nas
pernas e uma repentina secura na boca. (...) Todos os rapazes da cidade,
Gerald, inclusive, altos convencidos e prepotentes, com seus longos discursos e
elogios melosos, não moveram em ti um milésimo de emoção que sentiste diante do
negro.”.
De
propósito escolhi contar as partes mais ternas, mas o racismo está presente, é
como um fio de mágoa espalhado por toda a obra. Para saber mais tem que ler.
Itaúna
(MG), 15 de junho de 2018.
Cláudio lisyas Ferreira Soares
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