1.280 ALMAS

 

Imagem tirada do google imagens 

1.280 ALMAS

Jim Thompson

            Se o que você procura é uma leitura visceral, um livro cru e sem rodeios, certamente encontrará nas páginas dessa obra algo, que satisfaça seus instintos primitivos.

O linguajar é obsceno, sujo, potencialmente tóxico.

O personagem principal é amoral, inescrupuloso, não tem apego a nada e sob pressão é perigoso ao extremo.

Há uma abordagem fria, racista e machista, para aqueles mais sensíveis a estes temas o melhor é não ler.

Não tem compromisso com ética, nem com estética social aceitável.

Estamos diante de um psicopata ocupando o cargo de xerife. O perfil fica claro logo de início, porque tudo é minimamente calculado e você se sente dentro do cérebro maquiavélico de Nick Corey.

O mais interessante é que se não o tirassem da sua zona de conforto ele jamais teria tomado sequer qualquer das atitudes, que serão a partir de agora a força motriz por traz de sua personalidade distorcida.

Comecemos do começo: “Bem, meu senhor, acho que eu estava bem quietinho, tão quietinho como alguém poderia estar.

Nick Corey é o xerife do condado de Potts, ninguém naquele fim de mundo com 1.280 habitantes acredita na sua competência, inclusive sua esposa.

Ele está cansado de ser o alvo de chacotas, nem mesmo os cafetões o respeitam e sua fama de preguiçoso já chegou nos condados vizinhos, tendo se tornado uma pilhéria na boca de seus companheiros de profissão.

As eleições municipais para xerife haviam chegado e ele, segundo o promotor, estava com os dias contados, sem se falar que a cidade precisava de mudanças e porque não começar substituindo o xerife.

Se ao menos ele soubesse fazer outra coisa, mas não sabia, então, era melhor se mexer, tornar-se indispensável, nesse caso era melhor procurar ajuda no xerife do condado próximo, rio abaixo.

Conheci o Ken Lacey numa dessas convenções de homens da lei, na época ele até me deu conselhos sobre como me livrar de uma latrina, que ficava nos fundos da delegacia, bem a delegacia era na parte de baixo e não tinha janelas, portanto o mal cheiro não causava incômodo, mas eu morava no andar de cima e aí aquele ranço todo subia entrando pela janela, o que se agravava no verão.

Toda a problemática estava no fato de ela, “a latrina”, só incomodar a mim e a mais ninguém, além de estar em terreno público, portanto, de uso comunitário, poderia assim desagradar alguns eleitores. Eu estava num beco sem saída.  

Foi aí que ele me deu a solução, eu fui lá e fiz. Naquela mesma noite entrei sorrateiramente na latrina, soltei um prego aqui outro ali, dei uma remexida nas tábuas afrouxando-as e tratei de ir dormir.

Haviam muitos usuários da latrina, mas o mais frequente era o Sr. Dinwiddie, o presidente do banco local. Ele tinha o costume de usá-la, quando ia ao banco de manhã e na hora do almoço, fazia-o com frequência também quando voltava do almoço e no final da tarde, quando ia para casa no fim do expediente.

Uma coisa era certa, a que nunca falhava era da manhã, quando ia para o banco.  Na manhã seguinte à sabotagem noturna, lá estava ele pontualmente, muito apressado, entrou correndo e quando sentou-se as tábuas do piso cederam lançando o presidente do banco lá no fundo da vala, esparramando-o em trinta anos de estrume humano.

Nunca foi tão fácil remover uma latrina...

Agora, no entanto, tenho outro problema, como fazer com que todos acreditem que não tenho nada a ver com essas mortes no meu condado?

Apesar da linguagem chula, o autor constrói um tipo, viscoso e traiçoeiro, não impossível de ser encontrado por aí ocupando o cargo errado.

Sejam bem vindos ao mudo real de Jim Thompson.

Itauna-MG, 20 de junho de 2022.

Cláudio Lisyas Ferreira Soares

  

 

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