A HORA E A VEZ DE AUGUSTO MATRAGA
A HORA E A VEZ DE AUGUSTO MATRAGA
João
Guimarães Rosa
Difícil
falar de Guimarães Rosa, e me sinto totalmente suspeito, porque gosto “de com
força”.
Sua obra é marcada pela concisão e
profundidade.
A novela em questão está inserida no
livro SAGARANA.
Li faz algum tempo e me encantei com
as cercanias de Minas, das Gerais querida tanto dele, quanto minha.
A história se passa no sertão
mineiro, mais para o norte, tem aquele gosto de terra, ora ferruginoso, ora de
calcário.
Está presente o sentimento de
grandeza no universo da pequenez humana.
Matraga ou Esteves, valentão,
violento, amoral, desafeiçoado, mau por natureza, conhecido como Nhô Augusto.
Inicia sua jornada no declínio, no
abismo que ele mesmo cavou. Sua mulher fugiu com Ovídio, seus capangas bandearam
para o lado do Major Consilva.
Amargurado e desejoso de vingança
antes de se ver com Ovídio e a mulher prefere ir tirar satisfação com o Major.
É quando, sem saber segue para seu
calvário; surpreendido numa emboscada, a vida prega-lhe uma peça. Ela tem
encruzilhadas.
O Major Consilva encomendara que
marcassem o homem a ferro e depois dessem fim no pasmado.
E assim se fez marcaram o homem no
glúteo e o espancaram até a morte, enquanto esta assistia seu martírio. Num
acesso de puro desespero ante a violência da situação, levanta-se o desgraçado
e se atira do barranco estatelando lá no fundo todo perfurado como peneira,
tido por todos como morto e acabado, foi ali à margem do rio, abandonado.
A prosa lírica de Guimarães está pontilhada
de interlúdios fazendo graciosamente a passagem de cada estágio da novela.
Vez
ou outra se percebe a inclusão de quadras poéticas, como essas: “Mariquinha é
como a chuva:
boa é, p’ra
quem quer bem!
Ela vem
sempre de graça,
Só não sei
quando ela vem...”
“A roupa lá de casa
Não se lava
com sabão
Lava com
ponta de sabre
E com bala de
Canhão...”
Num resgate da cultura popular,
discute sem fronteiras a existência humana e transporta o regionalismo ao
patamar universal.
Augusto Matraga pensativo creu que chegara sua
vez, mas ainda não era a sua hora.
Virando-se como pode, deixa que o
rio leve-o correnteza abaixo, pensando ser ele sua mortalha, quando subitamente
é resgatado por um casal de velhos, dona Quitéria e pai Serapião.
Tempos de mudança, curam-se as
feridas muda-se o homem. Vira trabalhador, religioso, homem de paz. Não quer
mais vingança, mas ama a justiça. Há um resgate, a salvação é para todos. Tudo
é possível se tudo vai bem.
Augusto aprende, o padre ensina: “- Você nunca
trabalhou, não é? Pois, agora, por diante, cada dia de Deus você deve trabalhar
por três, e ajudar os outros, sempre que puder. Modere esse seu mau gênio: faça
de conta que ele é um poldro bravo e que você é mais mandante do que ele...
Peça a Deus assim, com esta jaculatória: “Jesus manso e humilde de coração,
fazei meu coração semelhante ao vosso...”
O mutante Matraga segue rumo ao
final feliz, no entanto a vida urge, enquanto o sertão agoniza, se Nhô Augusto
não existe mais, outro toma seu lugar, porque espaço vazio é para ser ocupado.
Se o velho homem está morto, também
pode ressuscitar caso a ocasião o exija, mas dessa vez para fazer o que é
certo.
Estragar o final e impedir, você
leitor, de ter sua própria experiência. Ah! não estou aqui para isso. Se você
nunca leu Sagarana a oportunidade é agora, deleite-se com a supremacia e a
pujança do mundo de Guimarães Rosa.
Itaúna(MG),
01 de setembro de 2016.
Cláudio Lisyas Ferreira Soares.
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